sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Para Mateus

Estava aqui te olhando e viajando... Você dormindo, tão lindo... Como o tempo passa rápido, como a gente muda... Você está grande, tão esperto, falando com tanta propriedade sobre tudo e todos. Aliás, não é de muito falar em público (pelo menos ao meu lado), mas quando fala é de perfeita dicção. Nem palavras que podem ser consideradas difíceis em sua idade te amedrontam... Apesar de uma conjugação que você não se conforma em falar como ela é porque é estranho mesmo (“mamãe, eu já di o seu beijo?”) – lindo!

Mas, eu estava mesmo viajando... E lembrando como, no fim de tarde do dia 06 de setembro de 2007, eu me sentia estranha. Uma cólica esquisita...  E eu nem estava atrasada ainda! Mas, achei aquela cólica suspeita. Na verdade, era como se eu percebesse uma presença, uma energia diferente naquela dor. Eu sentia como se alguma coisa estivesse “grudando” em mim.

E em meio a alguns telefonemas para uma amiga “experiente” que tinha acabado de ganhar um bebê, ela me disse assim: “Ai Neska, será? De repente está acontecendo a implantação”. Ops, implantação do que, aonde? Fiquei curiosa. Mas, tranquila. Liguei para o seu pai e disse bem rápido: “tem alguma coisa acontecendo comigo...”, e ele, todo desentendido, mal me respondeu.

Tudo bem, vou ali na farmácia comprar um teste. Mas, na bula diz que o resultado é mais certo se for feito com a primeira urina do dia. Afe! Vou ter que esperar até amanhã. A noite passou até tranquila e no outro dia, primeira coisa: xixi no copinho para fazer o teste. E foi rápido... As duas marquinhas que sinalizavam que o resultado era positivo apareceram logo. Mais do que eu imaginava e fantasiava!

E, mesmo com todas as dúvidas, a gente comemorou e ligou para a família. Estava a caminho o nosso primeiro bebê! Quanta emoção... De verdade mesmo, é uma emoção que a gente nem sabe de quê... É uma emoção apenas de saber a novidade, de contar para todo mundo, de imaginar, de idealizar.

Aí, o tempo vai passando, a barriga vai crescendo, as roupas apertando, a vida mudando, a casa se transformando para receber a pessoinha que a gente descobre ser um menino. E como vai se chamar? Bom, eu sempre tive certeza de qual seria o seu nome, mas deixei seu pai à vontade para refletir sobre ele. E isso demorou, o que deixou alguns ansiosos de plantão ainda mais ansiosos! Até que eu cansei e disse: “Quero mesmo que seja Mateus, porque eu li que significa ‘presente de Deus’ e eu já sei que meu filho é assim na minha vida, seja como for”. Pronto. Sabendo do significado, seu pai se convenceu e aceitou o seu nome. Engraçado que hoje ele olha para você e diz assim: “ele não podia ter outro nome, Mateus é a cara dele!”.

Ai Mateus, mamãe não via a hora de você chegar. Sonhava, planejava, idealizava, comia (e engordava), dormia demais e se realizava ao sentir os seus movimentos em meu ventre. Ô delícia indescritível! Bom demais. Adoro. Morro de saudades!

Depois de nove meses você chegou. E, com toda sinceridade, as coisas não eram nada como eu imaginava... Que dificuldade amamentar, que coisa horrível aquela queda hormonal a que fui “submetida”, que coisa estranha aquela vontade de chorar que me acometia por tantas vezes no dia... Meu Deus, o que era aquilo? Nada era como eu imaginava... Que ignorância a minha... Pensar que eu iria brincar de boneca...

Você era muito diferente disso e vou te falar, que trabalhão que você me deu, viu menino?! Mas, depois, graças a Deus, as coisas se ajustaram. Ou como bem disse uma amiga minha: “com o tempo tudo melhora, ou será que a gente se acostuma?!”. Bom, o fato é que eu me acostumei com as noites perdidas, com a amamentação, bastava você se movimentar no berço em seu quarto e eu já estava a postos!

E você cresceu, alcançou as etapas de desenvolvimento lindamente, sempre desafiando os seus limites, sempre disposto a provar para si mesmo que podia ir mais e mais! E eu de cá toda orgulhosa de sua coragem, de sua vontade... É um menino reservado, mas muito independente, seguro, um pouco marrento às vezes, mas muito, muito e muito amoroso... Cuidadoso comigo, amável, e, atualmente, grudado. Grudado na “mama”. Passamos a gestação do seu irmão juntinhos, você pequenininho comemorando ao saber que se tratava de um menino a quem você lindamente quis chamar de Lucas.

Foi então que Lucas saiu da barriga. Chegou em casa. E quanta novidade... quanta confusão, que coisa estranha (mais uma vez). Mamãe chorando, papai aflito, as pessoas ao redor consolando. O que era aquilo? E você ali, vendo tudo, observando, indagando. E era um tal de “especial para cá, especial para lá” e a mamãe só faz chorar... Isso não pode ser bom. Ela está triste. Como é que eu vou gostar desse menino? Ele é especial e só faz ela chorar? Eu bem imagino, meu filho, que você deve ter achado aquilo tudo muito estranho. O fato é que, por sua causa, abolimos a palavra “especial” no que diz respeito a fazer referência a Lucas. Porque vocês dois são especiais. Especiais e diferentes como todo mundo.

Que coisa boa, o tempo passa! E as coisas foram se organizando. Você aprendeu que seu irmão tem síndrome de Down (seja lá o que isso for) e que por causa disso, ele precisa de um pouco mais da nossa paciência para aprender algumas coisas. E aí? Isso importa o que mesmo? Você deu graças quando, enfim, Lucas parou de mamar e você pode ter a sua mãe de volta. E levou isso a ferro e fogo a ponto de inventar o tal “Nescau de colinho” que acontece lá em casa todos os dias por volta das 6:30 da manhã. Porque se ele toma vitamina no colo da minha mãe, porque eu não posso? Mas, eu quero Nescau, ta?! E não tendo regredido em nada (nem fraldas, chupeta, mamadeira), a única coisa que você exigiu foi o seu colo de volta (apesar dele nunca ter deixado de ser seu).

E morre de ciúme desse irmão que te ama tanto. “Eu odeio o meu irmão, mamãe, não te pedi irmão nenhum. Devolva ele para Papai do Céu!”, você me reclama quase que semanalmente com esse pedido. Ah, filho, não vai dar... Eu quis tanto te dar um irmão, quis tanto sair para trabalhar e ver vocês dois na boa companhia um do outro... Desejei com tanta vontade que ganhei o meu Lucas... E não devolvo ele por nada nesse mundo. Porque Lucas é tão importante quanto você. Porque eu amo vocês com tanta intensidade que não poderia nunca pensar em minha vida sem vocês, cada um do seu jeitinho. Mas, eu entendo tá! E não te reprimo de jeito nenhum! Não vejo pecado em suas palavras (eu já vivi isso, risos). Muito pelo contrário, eu sei que você ama aquela coisinha pequena que se alegra tanto ao te ver chegar, que acaricia seus cabelos com uma alegria contagiante. Que te grita do berço para chamar a atenção “Te-te”... Sei que por hora, as coisas vão sendo assim, mas tenho certeza que com o tempo você vai saber que esse menino, Lucas, veio mais de presente para você do que para mim...

Príncipe moreno amado da "mama"...

2 comentários:

  1. Nessa,que lindo!!
    Me emocionou...lembrei de quando meu segundo filho nasceu e ficou na UTI,eu voltei para casa chorando muito e minha filha me disse:Mãe por que vc está sofrendo?Você acabou de conhecer ele...incrivel como a gente ama igual e tão intenso...Realmente Lucas é um presente de Deus,vocês que são especiais por tê-lo na vida.
    Seus filhos são lindos e Deus abençoe sempre.
    Beijocas
    Tatiane Saad

    ResponderExcluir
  2. Que texto lindo, Van! Que registro sensível... Bom registrar para ele, quando crescer, saber exatamente como as coisas aconteceram. Lindões!!!!!!!!!!!

    Ah, vai lá no blog ver o sorteio. Ou não se interessou por nenhum prêmio??

    Te vejo amanhã na feira. Leva os dois, viu?? Vai ter história, música, brincadeiras...

    ResponderExcluir

Recalculando Rota*

A ideia de escrever esse texto surge de uma necessidade absurda de expressar a minha gratidão. Sim, esse é o sentimento mais marcante dessa...