segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Para lembrar... Sempre

O tempo passa rápido demais... e nessa velocidade, o meu primogênito já tem mais de quatro anos e algumas histórias, histórias essas que, inclusive, ele adora escutar de mim: "mãe, conta história de quando eu era pequenininho".
 
Mateus está mais conversador do que nunca, embora em público estranho ele não goste muito de falar, é tímido o meu filho. Ultimamente ele tem questionado algumas coisas. Não posso deixar de postar isso. Faz parte das descobertas, da percepção da diferença e da elaboração de seus pensamentos. Eu não reprimo, pelo contrário, tento entender como ele chegou a determinadas conclusões e analiso como devo colaborar para que ele construa bons sentimentos e compreensões adequadas a respeito do mundo e das pessoas.

No início de outubro, nós (“Ser Down” e amigos) comemoramos o dia da criança em uma casa de festas. Em horário de almoço, o que tornaria a minha vida um pouco mais corrida do que já é, mas consegui me organizar (Nina, a babá, foi comigo!) e eu não poderia deixar de comparecer a esse evento que é mais um dos que promovemos com a intenção de estreitar os nossos laços, conversar, trocar ideias, etc.

Bom, então que numa segunda-feira eu fui buscar meu "príncipe moreno" na escola e já o avisei que iríamos em casa para um banho, buscar Lucas e Nina e depois a gente ia para a festa das crianças promovida pelo grupo de pais da Ser Down e eis que escuto, automaticamente, a seguinte resposta (muito afirmativa por sinal):

- Ah, mãe, eu não quero ir. Já te disse que eu não suporto esse pessoal de síndrome de Down.

Ao que eu respondo muito calmamente, por saber que isso é fruto de um ciúme enorme e já relatado aqui que ele sente pelo irmão:

- Mas, filho, vai ser numa casa de festas. Acho que você vai gostar. Vai ter um monte de brinquedos para você brincar e curtir, além de outras crianças.

- Mas, mãe, eu já te disse...

Enfim, ignorei e mantive a minha decisão, até porque quem manda aqui sou eu, né?! Passei em casa, peguei o meu "príncipe galego", Nina e partimos para a festinha.

Chegando lá, em meio a tantos brinquedos, Mateus “pinotou” em direção ao “brinquedão” que ele adora e eu fui me encontrar com as minhas queridas amigas e seus filhotes para as nossas conversas gostosas com Luquinhas que foi ao encontro dos “amigos” e das brincadeiras de bebês. Depois de algum tempo “cada um no seu canto”, Gabriel, filho de minha "irmã de alma" Roberta (que também não queria ir, com o argumento de que ele não tem síndrome de Down), procurou Mateus e eu apontei para ele. Eles se encontraram pela primeira vez e... foi amor à primeira vista. Esses dois se curtiram, brincaram, "apresentaram" os irmãos um ao outro (Pepeu e Luquinhas) e conversaram, comeram, se divertiram e ficaram cheios de saudades (aliás, tô sem registro desse momento, mas vou providenciar com alguma das minhas amigas - Beta ou Cynara). Foi fantástico! Fiquei fã daquele momento e não esqueço jamais. Saíram de lá muito mais empolgados e, digamos que, acostumados com as "pessoas de síndrome de Down". Pelo menos, eu acho.

Depois disso, deixei a trupe em casa e voltei para o trabalho. Ao retornar, à noite, lá vem Mateus e suas perguntinhas nada fáceis de responder:

- Mãe, quando eu era pequeno e tinha síndrome de Down, você me adorava, né?!

E eu, engolindo seco, respondo:

- Mas, filho, você não tem síndrome de Down. E mais, eu te adoro sempre e para sempre vou te adorar. Você é meu filho querido e amado, assim como seu irmão.

- Mas, mãe, quando Luquinhas crescer, ele não vai mais ter síndrome de Down, né?

- Mateus, seu irmão nasceu com síndrome de Down, filho e assim será para sempre. Você não viu lá na festa, crianças maiores e até adultos?

- Eu vi mãe, mas eu não gostei... (disse ele, num tom inconformado).

E eu engulo mais seco ainda, encho meu coração e com os olhos marejados (tentando disfarçar), mas muito nervosa, pergunto:

- Por que você não gostou, meu amor?

- Ah mãe, eles tem a língua para fora. Mas, Luquinhas não tem a língua para fora. Você tem certeza que ele tem síndrome de Down?

- Tenho filho. As pessoas são diferentes, independente de qualquer coisa. Todos somos diferentes, você não notou isso?

- Eu não sou igual a Dudu, né mãe?

- Não, filho, e nem é igual a Miguel, a Antonio, a Rafa... (e começo a falar de cada coleguinha da escola e do prédio).

E Mateus sai. Não sei se conformado com a resposta ou se cansado de tanta dúvida. E chega o fim de semana. Ele desce para brincar na quadra do nosso prédio com Marcelo e no meio da brincadeira, Mateus perde no jogo e Marcelo brinca com ele. Ele olha desdenhosamente para Marcelo e diz: "Ai pai, você está com uma cara de síndrome de Down, viu?!". E eu, preocupada em saber o que significa pergunto: "Mateus, como é a cara de síndrome de Down?". E ele responde, de novo e como sempre, automaticamente: "assim, mãe, com essa língua para fora".

Pois é... essa foi a característica marcante naquele dia. Fiquei um pouco angustiada em como responder, mas acredito que o melhor mesmo seja não reprimir e nem fazer muito alarde. Mateus está descobrindo, observando e, de fato, nós convivemos demais com a diversidade e ele está percebendo e concluindo de acordo com as suas percepções. Eu estou aqui, como eu mencionei no início, para educá-lo para ser uma pessoa que respeite a todos, independente de suas diferenças. Mas, por enquanto, escuto, converso e tento fazer com que ele construa conceitos adequados a respeito de tudo e de todos.


Recalculando Rota*

A ideia de escrever esse texto surge de uma necessidade absurda de expressar a minha gratidão. Sim, esse é o sentimento mais marcante dessa...