No último dia 26 de outubro, viajei, na companhia maravilhosa da minha amiga Mani, para participar do VIII Congresso Brasileiro de Síndrome de Down, em Maceió. Confesso que não tinha nenhuma expectativa relacionada ao evento, apesar de ter elaborado toda a minha programação de palestras. Optei, em sua maioria, por palestras relacionadas à alfabetização e a aspectos fonológicos, considerando que meu Lucas está no processo de alfabetização e que tem (como a maioria das crianças com síndrome de Down) dificuldades com a fala. Sem saber, selecionei alguns temas que seriam apresentados por pessoas com síndrome de Down (segundo informações da organização, 20% dos palestrantes eram pessoas com síndrome de Down). Apenas a palestra de Léo e Dudu foi escolhida conscientemente. Nesse caso, porque já conhecia esses nomes desde o congresso de Campinas e das redes sociais. As outras escolhi simplesmente porque gostei do título.
E assim fui. Chegamos em Maceió por volta do meio dia e, por isso, perdemos a manhã de palestras e minicursos... Mas, já estávamos cientes disso e das nossas possíveis e consideráveis perdas. Mas, vamos aos ganhos! Primeiro ganho, de cara, era a oportunidade de passar esses dias na companhia da minha amiga querida. Nós aproveitamos, então, para deixar as coisas no hotel e desfrutar do almoço com calma. Depois seguimos para o Centro Cultural e de Convenções Ruth Cardoso. Aqui cabe expor a minha invejinha daquele espaço massa. Não muito grande, do tamanho ideal, acessível, bem localizado e bem dividido. Muito bem dimensionado e confortável para as mais de 2.000 (duas mil) pessoas presentes naqueles dias.
Vou preferir neste texto não falar muito sobre o conteúdo das palestras, minicursos e conferências técnicas (educacionais, terapêuticas e médicas) que acompanhei, mas me comprometo a publicar um pouco das minhas conclusões e reflexões do que assisti e algumas informações passadas por amigos em grupos de Whatsapp (já está quase pronto, pendente apenas de revisão).
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Nós duas! |
Quando lá chegamos, fomos recepcionadas por pessoas com síndrome de Down que eram parte ativa no congresso, nós revisamos as palestras que escolhemos e naquela tarde, decidimos por acompanhar o minicurso “Sons e gestos que alfabetizam”, ministrado por uma equipe multidisciplinar formada por pedagogas e fonoaudiólogas de Pernambuco. Massa. Achei muito bacana. Mas, eu saí antes de acabar, porque achei que a prática ficou um pouco confusa, e fui acompanhar o debate final do Fórum médico que acontecia no auditório.
Depois disso, nós (eu e Mani) fomos circular no espaço destinado a área social do evento, aonde acontecia uma feira de artesanato, além da presença de algumas associações, que montaram seus stands, livrarias, etc. e mais do que isso, tinha um palco em que muitas pessoas com a trissomia 21 se apresentavam. Felizes e brilhando, eles dançavam, cantavam, encenavam e interagiam com o público plenamente. Naquele tempinho que passamos ali, encontramos muita gente que foi de Salvador para Maceió e aproveitamos para matar a saudade e conversar sobre muitas coisas mas, principalmente, sobre os nossos filhos. Em seguida, fomos para o teatro aonde aconteceria a abertura oficial do congresso. LINDO DE VER! Um espetáculo de dança folclórica muito bacana. O teatro estava lotado. Muita emoção com a fala da presidente do congresso, Flávia Bandeira, e com o orgulho que ela expressava em poder figurar naquela posição e o quanto se sentia agradecida a todos. Foi lindo! O dia foi bem intenso, mas ainda deu para um jantar com a turma. A minha noite foi bem inquieta, cheia de pensamentos e saudades de meus pequenos.
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Apresentação folclórica na abertura do Congresso |
No outro dia, chegamos cedo para acompanhar a conferência de dr. Zan que abordou o tema “Protocolo Clínico de síndrome de Down da Sociedade Brasileira de Pediatria e resultados de pesquisa clínica em 40 anos.” Foi muito enriquecedor. Como essa conferência passou do horário previsto, seguimos para a sala aonde a fonoaudióloga Elisabeth Carrara nos esclareceria sobre “Apraxia da fala” e ainda estava sendo finalizado o debate sobre “Alterações clínicas na SD, diagnóstico e conduta: Imunologia e Respiratório.” Quando acabou essa mesa, a sala já estava lotada, aguardando Elisabeth começar a falar. Elisabeth é muito conhecida no meio terapêutico e é uma das referências em apraxia da fala, distúrbio da fala comum na trissomia do 21. Ela iniciou a palestra muito emocionada e emocionando a todos contando da sua filha, que também tem a trissomia do 21, e do quanto pretende retribuir à essa população com todo o seu conhecimento e por ter tido a oportunidade de exercitá-lo em casa com a filha.
Nesse dia o nosso almoço foi tão corrido que nós abrimos uma exceção em nosso rigor alimentar e experimentamos o hot-dog do Lipe. Depois passeamos mais e tietamos bastante! Essa pressa toda era para assistir à palestra da fonoaudióloga Érika Campos com o método dos dedinhos e dedinhos sing’s. Sensacional! Esse, inclusive, é um dos métodos que Ivalda (a fono de Lucas) está adotando e o que mais está tendo efetividade. Está sendo uma lindeza acompanhar ele executando os fonemas com o auxílio das mãos e dos dedinhos. Com a palestra de Érika, consegui entender melhor como ajudar de forma mais efetiva o meu pequeno (que já está grande, viu?!)
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Hot-dog do Lipe |
Então, quando acabou a palestra, nós seguimos para acompanhar a conferência sobre nutrição, do dr. Guilherme Collin e esclarecemos as nossas dúvidas. Quando acabou, fomos para a sala Jatiúca e lembra que eu falei que escolhi alguns temas despretensiosamente? Pois é! Nós acompanhamos as falas de João Vitor e de Jéssica Mendes, professor e fotógrafa, respectivamente. E namorados. E sensacionais, espetaculares. Pessoas conquistadoras, vitoriosas. Eu sentia uma emoção indescritível, o amor e a gratidão transbordavam em mim com a oportunidade de ver aqueles jovens contando suas histórias, momentos bons e ruins. Saímos daquela sala com o coração preenchido de amor e felicidade. Fechamos a programação do dia com muita alegria e fomos celebrar!
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João Vítor encantando a todos nós! |
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Tietando Jéssica |
O dia seguinte, e o último, também era um dia cheio de novidades. Iniciamos com a palestra “Desenho universal para aprendizagem” com Mara Sartoretto e Rita Bersh da Assistiva – Tecnologia e Educação do Rio Grande do Sul. Essa palestra nos mostra claramente como o desenho universal é importante para todo e qualquer aluno, independentemente de qualquer condição “especial” ou “clínica”.
Em sequência, eu tinha programado acompanhar a mesa do dr. Alberto Costa (para compreender melhor do que tratam as pesquisas sobre a memantina), mas depois das falas de João Vitor e de Jéssica no dia anterior, mudei meus planos e fui acompanhar a palestra “Empoderamento – Oi! Eu estou aqui!” proferida pela belíssima Tathi Piancastelli. Gente! A sensação é de que eu ia explodir de emoção com aquela mulher. Meu Deus! Pra começar, a mãe dela, Patrícia Heiderich, passou a posição de mediadora para outra pessoa com o forte e maravilhoso argumento de que ela preferia que Tathi fosse a protagonista daquele momento, assim como é na própria vida. Tathi foi esplêndida. E quero registrar que não estou me referindo apenas à uma pessoa que tem a síndrome de Down, estou me referindo a um ser humano pleno e consciente de sua própria vida. E mais, que esfrega na nossa cara o quanto somos frágeis e medíocres. Porque Tathi brilha e é de uma fortaleza inspiradora. Sim! É o que eu posso dizer dela! Ela me inspirou tanto! Era visível na plateia os olhares de admiração e no de algumas pessoas com a trissomia 21 que se manifestaram inspiradas por Tathi. Antes da palestra, eu conheci Vinícius Stredda, escritor e um dos protagonistas do documentário “Geração 21” de Alex Duarte. Eu e Mani saímos dessa palestra, de novo, cheias de amor e muita emoção!
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Com Tathi Piancastelli - inspiradora |
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Vinícius Stredda, gentileza em pessoa |
Depois disso, ficamos na sala para assistir à palestra “Encontro de irmãos – Diversidade e adversidade: superando as diferenças e deficiências” apresentada por Dudu do Cavaco e seu irmão, Leonardo Gontijo. Pense em mais um momento emocionante. Muita gente foi às lagrimas com o talento daqueles dois e com todo o amor envolvido. Sou fã de Dudu e também de Léo, por sua luta, por suas vitórias e por sua dedicação.
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Dudu abafando em um shopping da cidade |
Então, a gente conseguiu almoçar no local do evento com calma e depois fomos assistir à palestra sobre sexualidade e afetividade que aconteceu no dia anterior e precisou ser repetida, porque a sala ficou lotada (acredito que esse tema tenha sido subdimensionado pela organização do evento). Todos queriam entender melhor sobre o assunto que é um tabu em qualquer contexto, mas que quando se trata de pessoas com deficiência intelectual, o tabu fica ainda maior, e também ouvir a experiência de Fernanda Honorato que é outra inspiradora. Mas, como tinha uma roda de conversa entre jovens e adultos com a trissomia 21, abordando o mesmo tema naquele horário, Fernandinha apenas se apresentou, nos presenteou com sua fala e seguiu para a outra sala. A psicóloga Fabiana então conversou com a gente sobre o tema. Sensacional!
Para encerrar, a jornalista Claudia Werneck nos presenteou com sua conferência “Acesso à informação e comunicação: cidadania e participação social para a pessoa com deficiência intelectual”. Com a proposta de tornar de fato a comunicação inclusiva para todos, ela distribuiu placas com os dizeres “linguagem simples” para que o público interagisse durante sua fala. Claudia iniciou apresentando uma discussão filosófica sobre o tema e me ganhou com as suas reflexões. Tanto sentimento que eu compartilho... tantas coisas que me fizeram brilhar os olhos... porque eu ouvi daquela mulher (fantástica, militante, inteligente, maravilhosa) muitas coisas que tem povoado os meus pensamentos... Mas, fechando o meu entendimento sobre a fala dela, é impressionante como nos julgamos eficientes na comunicação e o quanto subestimamos as pessoas com deficiência em um mundo em que o maior problema de todas as organizações, relações, famílias é exatamente a comunicação. Uma das fonos que acompanhei conceituou comunicação como “tornar comum” e esse conceito me conquistou. Caramba, como é difícil se comunicar, tornar comum um pensamento, uma reflexão. Foi uma palestra absurdamente esclarecedora, maravilhosa.
Minha opinião é de que foi um evento muito bem organizado, bem cuidado e muito melhor ainda articulado. Mas, senti falta de especialistas em suplementação, apesar de eu não suplementar Lucas, que pudessem ampliar a discussão sobre o assunto que foi, de alguma forma, muito criticado. Acredito que a participação desses especialistas seria de grande contribuição para estudos e mais ainda para aqueles pais que ainda estão indecisos sobre como proceder. Eles poderiam ouvir diferentes opiniões e buscar aquilo que concluíssem ser melhor para seus filhos (óbvio que consultando os especialistas em um outro momento).
E eu quero encerrar esse texto com uma frase de Vinícius de Moraes apresentada pela psicóloga Fabiana Lisboa no encerramento da sua palestra sobre "Sexualidade e Afetividade": "Palavra cretina essa: invalidez... Inválidos são os que, de plena posse de todos os seus movimentos, mantém a vida paralítica dentro deles, e só pensam em paralisar a dos demais" e com a imagem abaixo trazida por Léo e Dudu em sua palestra. Reflita!